quinta-feira, fevereiro 26, 2009

O futebol e a morta

Cheguei no CFCH para ver uma defesa de tese sobre futebol. Eu havia visto a apresentação parcial do trabalho em seminário e fiquei curioso para ver o resultado final. Deixei o carro estacionado atrás do prédio, ao lado do Centro de Educação. Observei o espaço retrabalhado na estrutura lateral inferior do colosso vertical e pensei nas reclamações de meu amigo Bernardo acerca do desrespeito ao patrimônio moderno que constitui as modificações ali feitas. E ensimesmado refleti : eu sempre achei que o característico de nossa arquitetura - mais do que as linhas mestras desenhadas por um arquiteto, e redesenhadas pelos os usuários e outros arquitetos- eram as inumeras reapropriações e modificações realizadas ao longo dos anos sob o mero improviso das demandas práticas do espaço.

O pensamento veio rápido e, sem o vento típico do lugar, não mais voltou. Subi o elevador pensando coisas desconexas. Tentei inutilmente modificar meu Currículo Lattes na sala de computadores do PPGS. Saí da sala meio irritado e...

A mulher estava lá, no chão com a cabeça espragatada. Tomou o lugar da minha reflexão e o da de Bernardo (que estava lá só em meu pensamento). O CFCH virou um espaço simbólico marcado pelo suicidio desesperado de alguém. Por que não colocar grades, perguntaram alguns já acostumados com outras prisões civis. Por que não telas? Devolveu um de relance. Um outro, mais nobre, fala em crachás, mas é retrucado em seguida: “a maioria dos suicidas era estudante daqui.” Não houve tréplica.

Eu gostaria de ter assistido a defesa da tese até o fim. Mas tinha psicanálise, ou seja, o meio de campo estava embolado. Naquele campo molhado, cheio de lama, falei da morta e do impalpável pathos da morte. O futebol, apesar de ser vários (profissional, amador, pelada), perdeu o impacto. A torcida morbida continuava presente, olhando o corpo colado ao solo. A inerte se perdeu para sempre, sem drible de volta... "sem drible de volta" respondeu a analista. Sim, "sem drible de volta". Respondi...


7 comentários:

João disse...

um abraço.

Bernardo Jurema disse...

o que atrai tantos suicidas pro cfch acho que nao seja nada que lhe seja peculiar. ele é alto e público. atribuo à falta de espaços altos e públicos pra prática de um suicídio bem sucedido, na cidade. e eu sou contra a ideia de grades (mas que povinho pra gostar de grade esse nosso hein!). refraseando o presidente lula: deixa o homem se matar!

pedrasepernas disse...

Olá!

Sou da graduação em ciências sociais e estou a confeccionar minha monografia sobre a literatura de Eduardo Galeano, com vistas a entender o processo de construção ou reconhecimento do estado de identidade cultural vigente na latinoamérica. Pois então estou eu repetindo esse discurso, que já é de pronto, pra 3 pessoas diferentes na semana antes dos festejos de Momo e eis que as 3 pessoas me falaram que eu devia te procurar, uma delas foi o professor Jorge Ventura. Pois bem, saí a tua caça. E imaginas o meu trabalho dificultado por estar no encalço de um João da Silva! Nada de email no lattes, nada no site do PPGS, nada em orkut (nada aqui funcionando toscamente, já que sim, encontrei muuuitas referências respondendo pelo seu nome). Então, encontro esse blog, etapa posterior de te encontrar em outro blog através do uso do ctrl+c e ctrl+v do títluo de teu trabalho na SBS 2007.
hahahahah

Percebes minha agonia?
Acho que você poderia me ajudar um tanto com minhas ainda bem embrionárias idéias monográficas.
Te dou meu email: manuelledeoliveira@gmail.com

Perdão pela verborragia, mas não conseguiria sem ela demonstrar minha curiosidade e ansiedade por conversarmos.

Um abraço,

Manuelle

Anônimo disse...

Por essas e outras sempre venho aqui. O blogue e suas diferentes vozes. Jampa, o último lírico do CFCH, driblando o futebol para encontrar-se com o o suicidio que nem Durkheim explica. O absurdo da morte estatelada na calçada da Várzea, sem dignidades filosóficas de um Camus. Chego aqui e encontro Bernardo, tal como um planejador urbano, pensando em espaços públicos para um suicidio bem sucedido. Alunas com as veias totalmente abertas da America Latina em busca sôfrega por Jampa. Não é verdade que não existe pecado ao sul do Equador. Mas é bem verdade, que não existe monotonia. Um abraço, meu amigo!

Anônimo disse...

Caramba pessoal...

Cesar, apesar de ser o ''último lírico do CFCH', reconheço secamente que você é o único de Chigago! E cheio de humor puxado pelo politicamente incorreto Bernardo... Vocês meus amigos, só vocês! Rir para não chorar.

Manuelle, seja bem vida, a casa é de todos. O blogue aqui é feito casa de vó...
Abração a todos.

slavo disse...

Nunca tive a felicidade de ver o suicidado no CFCH, parecia que eles esperavam eu não estar lá... te tanto ouvir falar nos suicidos cefichinianos desenvolvi uma curiosidade... a questão é o sujeito pela o elvevador e vai subindo.. entre geografia, história, psicologia, sociologia, antropoliga, politica, e ele desembarca no 14o , em filosofia e descobre que aquele prédio todo não serve para nada... só metafísica... nada de respostas físicas... dai salta..

Anônimo disse...

Jorge, sua teoria tá tão politicamente incorreta quanto a de Bernardo. Tá ótima!

Quem sou eu (no blogue)

Recife, Pernambuco, Brazil
Aqui farei meu diario quase intimo. Mentirei quando preciso. Escreverei em português e, mal ou bem, seguirei com certa coerência as ocilações do espirito, carater e gosto. Desprovido de inteligência precisa, justa será apenas o nome da medida que busca o razoavel no dito. Esperançoso. Jovem gasto, figura preguiçosa e de melancolia tropical sem substância. Porém, como já exprimido em primeiro adjetivo, qualificado e classificado na etiqueta quixotesca. Com Dulceneas e figuras estranhas o "oxymore" pode ser visto como ode a uma máxima de realismo outro do de Cervantes: "bien écrire le médiocre", dizia Flaubert. Mediocres serão meus dizeres. Bem ditos, duvido. Por isso convenho: os grandes nomes citados não devem causar efeito de legitimação. E previno: o estilo do autor das linhas prometidas é tosco, complicado e chato. O importante é misturar minha miséria com outras. Assim o bem dito será o nome de uma vontade de partilhar uma condição e não o da sutileza formal. A bem dizer, aqui findo com minha introdução.