quarta-feira, março 10, 2004

Plano

Não escrevo desde domingo. Estive concentrado, muito concentrado no início da redação de meu mestrado. O amigo Cesar, pediu a entrega dos meus planos. Vou tentar, mas previno da ambição, do careter grandiloquente do tema. Eh chocante perceber o quanto não cresci intelectualmente e vivo rodando em circulos. Mas vamos lá, espero que aguentem.

O tema que guia minha "reflexão" é o da relação entre litératura e sociologia. Desde o primeiro contato com a sociologia francesa (na França) uma pergunta aparentemente tôla me vinha ao espirito de maneira recorrente: por que os sociologos têm tanta necessidade de dizer que não são escritores?
Pois bem. Alguns trabalhos de historiadores, sobretudo o livro de Wolf Lepenies "Les trois cultures: entre littérature et la science l'avenement de la sociologie", fornecem uma visão precisa de como da tensão entre litératura e ciência a sociologia aparece como uma alternativa hibrida possível para responder um certo numero de questões. Sob o olhar histórico atingimos a questão do surgir da nova disciplina. E chegamos mesmo a entender o quanto alguns pontos de seu esforço para adquirir legitimidade dependia da distância tomada em relação à literatura. Sem entrar em detalhes, não acho ser impostura dizer que essa tensão é ainda hoje objeto de querelas dentro e fora da sociologia. Basta pensar no ultimo livro de P. Bourdieu "La misére du monde" ou nos trabalhos do sociologo B. Lahire que elaboram, a partir do "récit de vie", aquilo que este ultimo chama de "portrait sociologique". Acreditando ser um tema de atualidade imagino que as relações de conflito vividas na Europa no momento mesmo da gênese historica da disciplina tiveram história outra em região ultra-atlântica. A America Latinta, e talvez em particular o Brasil, teve elemento vário do Europeu e por isso exista lá fecunda imbricação a ser estudada dando novos contornos a questão. O que na Europa se viveu como criação de um campo (champ) especifico de conhecimento justamente com demarcações precisas de territorios simbólicos, no Brasil se construiu em superposição, em composição.
O que busco são elementos dessa composição na obra de Graciliano Ramos. Literatura não é sociologia, mas tensiona com esta quando busca fazer um trabalho de mesmo estatuto. Toda literatura do real (ou realista) ao tentar se apropriar do mundo social se compõe de elementos sociologicos e modifica-os a sua maneira. Minha análise dos textos de Gracialino tenta se ocupar de aproximações e distanciamentos entre literatura e sociologia. Engraçado perceber por exemplo que algumas querelas epistemologicas convivem harmônicamente em Infância para criar ao mesmo tempo o "efeito do real" e o "efeito poético do real". As lembraças do menino que bem podem ser vistas como descrições husserlianas de experiências do passado(talvez Bergson seja o filosofo da fenomenologia que tenha trabalhado mais o tempo passado), são contrastadas com analises objetivantes e frias do adulto próprias ao mais contudente dos positivismos. As primeiras, talvez paradoxalmente, criam o efeito do real mostrando um passado escorregadiço tal como ele se apresenta na cabeça de quem lembra. As segundas, por contraste, criam o efeito poético de quebra do universo ludico da criança pelo adulto...
Então é mais ou menos assim que corre meu plano: parto da gênese historica da disciplina sociologia na Europa. Constato a atualidade da questão. Verifico que o Brasil é um "terain" original a esse respeito. Gilberto Freyre, Sergio Buarque e quantos outros exemplificam tipicamente a importância desse pensamento hibrido. Examino como caso a literatura de Graciliano Ramos: quais os elementos de sua composição são reperáveis como sociológicos, quais não são. Desse esmagar de cana o bagaço é uma réflexão sobre a possível coexistência entre dois valores atinômicos: o da arte e o da ciência. Um oxymore!

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Quem sou eu (no blogue)

Recife, Pernambuco, Brazil
Aqui farei meu diario quase intimo. Mentirei quando preciso. Escreverei em português e, mal ou bem, seguirei com certa coerência as ocilações do espirito, carater e gosto. Desprovido de inteligência precisa, justa será apenas o nome da medida que busca o razoavel no dito. Esperançoso. Jovem gasto, figura preguiçosa e de melancolia tropical sem substância. Porém, como já exprimido em primeiro adjetivo, qualificado e classificado na etiqueta quixotesca. Com Dulceneas e figuras estranhas o "oxymore" pode ser visto como ode a uma máxima de realismo outro do de Cervantes: "bien écrire le médiocre", dizia Flaubert. Mediocres serão meus dizeres. Bem ditos, duvido. Por isso convenho: os grandes nomes citados não devem causar efeito de legitimação. E previno: o estilo do autor das linhas prometidas é tosco, complicado e chato. O importante é misturar minha miséria com outras. Assim o bem dito será o nome de uma vontade de partilhar uma condição e não o da sutileza formal. A bem dizer, aqui findo com minha introdução.