quarta-feira, março 24, 2004

Um bruto de sensibilidade

Pausa na melancolia pequeno-burguesa e egocêntrica do blogue para leitura de um poema seco, maduro. Poesia de faca e pedra, socos em palavras referidas a um homem duro, um cascudo. Na verdade, uma ode seca ás vozes de um autor retentor de palavras. Rentendo o dito para expressa-lo em língua de lâmina afiada(falo com o que falo), e depois refletí-lo(falo somente do que falo) de maneira humana e engajada( falo por quem falo), findando por repatí-lo(falo para quem falo). O rio que corre das vidas secas pelo verso de João Cabral.

Graciliano Ramos (por João Cabral de Melo Neto)

Falo somente com o que falo:
com as mesmas palavras
girando ao redor do sol
que limpa do que não é faca:

de toda crosta viscosa,
resto de janta abaianada,
que fica na lâmina e cega
seu gosto da cicatriz clara.

***

Falo somente do que falo:
do seco e de suas paisagens,
Nordestes, debaixo de um sol
ali do mais quente vinagre:

que reduz tudo ao espinhaço,
cresta o simplesmente folhagem,
folha prolixa, folharada,
onde possa esconder-se a fraude.

***

Falo somente por quem falo:
por quem existe nesses climas
condicionados pelo sol,
pelo gavião e outras rapinas:

e onde estão os solos inertes
de tantas condições caatinga
em que só cabe cultivar
o que é sinônimo de míngua.

***

Falosomente para quem falo:
quem padece sono de morto
e precisa um despertador
acre, como o sol sobre o olho:

que é quando o sol é estridente,
e contrapelo, imperioso,
e bate nas pálpebras como
se bate numa porta a socos.

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Quem sou eu (no blogue)

Recife, Pernambuco, Brazil
Aqui farei meu diario quase intimo. Mentirei quando preciso. Escreverei em português e, mal ou bem, seguirei com certa coerência as ocilações do espirito, carater e gosto. Desprovido de inteligência precisa, justa será apenas o nome da medida que busca o razoavel no dito. Esperançoso. Jovem gasto, figura preguiçosa e de melancolia tropical sem substância. Porém, como já exprimido em primeiro adjetivo, qualificado e classificado na etiqueta quixotesca. Com Dulceneas e figuras estranhas o "oxymore" pode ser visto como ode a uma máxima de realismo outro do de Cervantes: "bien écrire le médiocre", dizia Flaubert. Mediocres serão meus dizeres. Bem ditos, duvido. Por isso convenho: os grandes nomes citados não devem causar efeito de legitimação. E previno: o estilo do autor das linhas prometidas é tosco, complicado e chato. O importante é misturar minha miséria com outras. Assim o bem dito será o nome de uma vontade de partilhar uma condição e não o da sutileza formal. A bem dizer, aqui findo com minha introdução.