Variações entre miserabilismo e populismo
Escrevo esse texto motivado por um pequeno debate existente entre mim e meu amigo Júlio. No fundo, uma pequena querela sobre o fenômeno do lixo cultural e das leituras que podemos fazer dele num texto para o "grande público". Além disso, também vou procurar alargar o debate no sentido de analisar a questão de maneira livre, porém me detendo aos pormenores das estruturas analíticas usadas por mim. Coisa que sempre costumo fazer para treinar, mesmo em textos despretensiosos, a pretensiosa prática da reflexividade levada ao extremo: analisar as condições de analise é sempre uma das maneiras mais seguras de tentar controlar o nível de "pré-julgamentos" daquilo que dizemos. Mesmo que isso não nos dê garantia plena da verdade dos nossos ditos, dá ao leitor elementos para entender melhor, em etapa posterior, os erros ocorridos e os preconceitos emitidos, garantido assim, senão a verdade dada pelo o esforço do autor, ao menos a verdade decorrente desse esforço.
A)- A variação entre miserabilismo e populismo em textos acadêmicos
Vou tentar discorrer em tipologia sobre coisas que em realidade só existem de maneira compósita nos textos. Apenas em alguns casos grotescos poderiamos encontrar miserabilismo e populismo de maneira pura, sem as oscilações e variações dos elementos constituintes das duas visões caricaturais do popular decorrentes de tipos de análise especificas do que se diz popular. Como não poderia deixar de ser, os tipos de análise são também variados e ambivalentes nunca aparecendo em estado puro. Motivo pelo qual concordo com a opinião emitida por Júlio quando disse que " é preciso ser cuidadoso para falar sobre esse assunto sem soar preconceituoso. Você vai experimentar e sentir isso." Porém, vejo que é justamente na palavra cuidadoso o lugar onde esconde-se os melhores indicadores para esse debate. Pois o preconceito é para mim geralmente o resultado de uma falta de cuidado. Porém é preciso cuidar do cuidado que devemos ter, se me faço claro. E para isso é preciso recorrer ao entendimento dos elementos constitutivos das formas de encarar a cultura popular no discurso. Além disso, deve-se evidenciar o que se coloca em jogo quando arbritamos entre essas formas.
B) Pequena Reflexão sobre a analise ideológica e da produção do miserabilismo
O que me incomda em certos textos é o fato de se aceitar de maneira acrítica um elemento do discurso recorrente em arte sobre a questão do bom gosto. Lixo cultural, parece-me, como também o kitch, duas faces de um mesmo fenômeno de classificação desvalorizante da produção artistica dita popular. Recorrem os artitas do kitch e do lixo cultural, enquanto ideólogos do discurso da reutilização das "artes menores", ao arbitrário argumento de que existem pessoas capazes de dar verdadeiro valor estético ao que antes se apresentava apenas como "experiência espontanea" da vulgata pseudo-artistica da produção popular. O que deveria obrigar, da parte de quem analisa a questão, seja ele jornalista, sociólogo ou qualquer outra coisa que os valha, uma preocupação sobre as razões e justificativas de um tal argumento.
Para mim, por um lado, é preciso recorrer à uma analise idelógica de corte sociológico para reenquadrar os elementos dessa problemática de maneira mais adequada. Porém sei que, por outro lado, isso seria imcompleto para uma leitura visando o perfeito entendimento do valor das obras produzidas por populares. De fato, além da questão da dominação das "elites culturais" sobre os produtores das "artes menores" existe o fato, ao meu ver pouco contestável hoje, da relativa autonomia entre as culturas. Fato que daria ao produto das artes populares um valor em si digno de nota e que, não poucas vezes, nos discursos demasiadamente relativisticos, incorrem no erro populista de eliminar o fator de dominação para afirmar de maneira errônea a autonomia total das artes populares.
C) Exemplo paraibando em Recife: um caso típico do discurso da reutilização.
Em Recife temos um bom exemplo desse contraste que mereceria um estudo: Ariano Suassuna e seu projeto estético armorial. Mas quem teria a coragem de fazer um trabalho crítico sobre o autor do Alto da compadecida? O fato é que a obra de Ariano é rica por ser produto da tensão entre as duas formas de ver a arte popular sendo também uma tentativa de superá-la. Não seria dificil perceber no projeto mesmo da arte amorial que a fusão do popular e do erudito acontece de maneira tal que os motes populares são estetizados à maneira erudita. A estética é um elemento próprio da erudição(enquanto trabalho refletido sobre o conhecimento de outras formas estéticas) e "populariza-la" seria incorrer em mau gosto. Melhor, mais artistico é fazer o contrário. Eis o conteudo implicito do miserabilismo presente na obra de Ariano. Claro que no discurso dele tudo parece se resolver em frases como: existe bom e mau popular como existem bom e mau erudito. Porém, como creio, isso não elimina o fato das diferentes práticas artisticas em seus respectivos graus de valorização na sociedade(principalmente no campo da arte) continuarem a ser os instrumentos de medida do valor em arte. E quando dou esse exemplo, sei que podemos encontrar no mesmo autor, elementos populistas oriundos de sua admiração da arte popular. Quantas e quantas vezes não vimos Ariano defender a arte do povo pelo simples fato de sua espontaneidade? Ser espontaneo é próprio da cultura popular. Questão de praxis: como averiguar e quem decide o que é o bom e o belo das expressões espotaneas? Ao que vejo só alguns ilustrados, eruditos, na mesma lógica miserabilista de antes, parecem ou aparecem, para conferir valor a tais práticas querendo lhes atribuir valor artistico(talvez o mesmo da arte erudita).
Vejam que não tento resolver aqui o problema, mas e mais apontar para a problemática. Insisto que a tensão é indissolúvel ao meus olhos, contudo acho que a anlise dos limites dela pode ajudar a amenizar os riscos de reprodução do preconceito alheio.
Por hoje é isso que estou cansado.
segunda-feira, janeiro 24, 2005
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Quem sou eu (no blogue)
- Jampa
- Recife, Pernambuco, Brazil
- Aqui farei meu diario quase intimo. Mentirei quando preciso. Escreverei em português e, mal ou bem, seguirei com certa coerência as ocilações do espirito, carater e gosto. Desprovido de inteligência precisa, justa será apenas o nome da medida que busca o razoavel no dito. Esperançoso. Jovem gasto, figura preguiçosa e de melancolia tropical sem substância. Porém, como já exprimido em primeiro adjetivo, qualificado e classificado na etiqueta quixotesca. Com Dulceneas e figuras estranhas o "oxymore" pode ser visto como ode a uma máxima de realismo outro do de Cervantes: "bien écrire le médiocre", dizia Flaubert. Mediocres serão meus dizeres. Bem ditos, duvido. Por isso convenho: os grandes nomes citados não devem causar efeito de legitimação. E previno: o estilo do autor das linhas prometidas é tosco, complicado e chato. O importante é misturar minha miséria com outras. Assim o bem dito será o nome de uma vontade de partilhar uma condição e não o da sutileza formal. A bem dizer, aqui findo com minha introdução.
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